LEMBRAI-VOS
DA GUERRA
Pinto Silva Carlos Alberto[1]
“......A gente conhece-os por militares.......
Corações mesquinhos alcançam-lhes em rosto o
pão que comem; como se os cobres do pré pudessem pagar a Liberdade e a Vida.
Publicistas de vista
curta acham-nos caros demais, como se alguma coisa houvesse mais cara que a
servidão.
Eles, porém, calados, continuam guardando a
Nação do estrangeiro e de si mesma............” (Ao El-Rei de Portugal, Dom
Carlos I - Moniz Barreto / 1893)
Em 17 de setembro de 2024, o presidente da república Luís Inácio da
Silva, autoridade suprema a quem as Forças Armadas, de acordo com artigo 142 da
Constituição Federal, estão subordinadas, anunciou, diante de ministros e chefes de poderes
reunidos para discutir ações contra as queimadas florestais que assolam o país,
que sugeriu às Forças Armadas que os recrutas sejam treinados para combater
queimadas e enfrentar desastres climáticos.
Na ocasião declarou:
"Eu tive uma conversa muito longa com o
ministro José Múcio e o General Tomás. E a sugestão que eu dei para ele é que
daqui para frente todos os 70 mil recrutas que são convocados para as Forças
Armadas todo ano, e a gente não tem guerra, portanto, não precisa preparar
ninguém para a guerra porque a gente não vai querer guerra, que essa meninada
seja preparada para enfrentar a questão climática". (portal g1.Globo –
17/09/24).
O atual presidente, como muitos que o antecederam,
negligência o cenário político internacional e demonstra ignorar a destinação
das Forças Armadas prevista na Constituição Federal de defesa da Pátria,
garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da
lei e da ordem.
Ao contrário do que o presidente pensa, vê-se no
mundo um claro acirramento das disputas geopolíticas entre EUA, China e Rússia
e uma vasta variedade de cenários e propósitos com possibilidade para ameaçar e
afrontar interesses imprescindíveis ao nosso país.
O
combate do futuro exigirá cada vez mais recursos humanos capacitados,
adestrados, experimentados, motivados, permanentemente disponíveis e
comprometidos com os valores mais caros à instituição. Nesse viés, competência
essenciais serão requeridas aos líderes nos diversos níveis, bem como aos
demais elementos das frações de emprego. (Manual de Fundamentos Conceito
Operacional do Exército Brasileiro – Operações de Convergência 2040
(EB20-MF-07.101), 1ª Edição,2023.)
Os desafios e o ambiente operacional
futuro sinalizaram para a Instituição a necessidade de se preparar e adequar
para atender às demandas visualizadas no COEB, bem como às orientações do
Ministério da Defesa. (Concepção de
Transformação do Exército Brasileiro e do Desenho da Força 40 2024-2039 (EME –
2024))
Nessa percepção, o presente texto procura apresentar
ideias e argumentos que resultem em uma motivação necessária a qualquer escalão
(C Mil A, DE, Bda, OM) para o aprimoramento de suas atividades, tendo por
objetivo uma maior eficiência, eficácia e efetividade Operacional em todos os
níveis, no entendimento de que a dimensão das Forças Armadas na defesa dos
interesses nacionais exige uma constante atualização tecnológica e um
aprimoramento ininterrupto de seus integrantes.
“É forçoso salientar a imperativa
necessidade de os comandantes, em todos os níveis, contarem com elevada
iniciativa, além do perfeito entendimento do princípio de cumprimento da missão
pela finalidade.” (idem)
A IDÉIA MOTRIZ nas Forças Armadas deve ser a
obtenção da Capacidade Operacional Plena de acordo com a vocação prioritária do
escalão considerado, na
compreensão de que em uma FA, ela se manifesta como um poder moral definido,
que pode ser extraído pelo pensamento dos seus componentes e seu efeito
avaliado, como uma ferramenta cujo poder pode ser calculado.
Uma Força que em face do perigo real combate por cada centímetro do
terreno; que jamais se amedronta com receios imaginários; que é disciplinada;
que não perde a confiança em seus Chefes, nem deixa de respeitá-los; cuja
capacidade física é fortalecida pela privação e pelo exercício; que conhece e
segue seus princípios de gestão; em que seus oficiais são criativos,
inovadores, ousados, perseverantes e determinados: esta é uma Força dotada da
Capacidade
Operacional Plena.
O comprometimento
pessoal com a missão e os valores cultuados pela Força será o fator de êxito
que multiplicará o seu poder
de transformação.
"Um Comandante sóbrio jamais deve
permanecer ocioso nos tempos de paz, mas sim fazer destes tempos um capital que
possa valer na adversidade, a fim de que, quando sua sorte mudar, o encontre
pronto. Por conseguinte, o militar não deverá nunca desviar o pensamento do
exercício da guerra, devendo exercitar-se mais nos períodos de paz que nos
tempos de guerra, o que pode realizar de duas formas: uma através das ações e
outra através do pensamento. Nos tempos de paz deve pensar nos meios de
conduzir a guerra, ler obras de história, observar como os grandes homens se
comportavam nas guerras, examinar os motivos de suas vitórias e derrotas, de
modo que possa estas evitar e aquelas imitar" (Adaptação - Maquiavel).
Os padrões militares englobam
valores, ética e conduta, que influenciam o comportamento dos soldados e são
essenciais para a eficiência das Forças Armada.
“A disciplina representa um fator vital para que o
Soldado acredite no Exército e em seus chefes. A disciplina significa não
apenas ser eficiente, mas, também, se preocupar com pormenores”.
“O rebaixamento nos padrões militares revela um declínio
de disciplina; as boas unidades em combate têm bons índices disciplinares. A
imagem popular do combatente roto, sujo e barbado são, em realidade,
indicativas do Soldado que não sofre supervisão e revela logo ausência de
chefia e disciplina". (Training Operation Lessons Learned, 1968, p. 8).
“Sabíamos por experiência em combate que as unidades mais
aguerridas, em longas jornadas, não eram necessariamente aquelas com mais
reputação, mas as que, ao retornar das refregas, de imediato, recompunham a
disciplina formal e a apresentação”. (Slim, 1956, p. 543).
A preservação e aprimoramento da cultura já
consolidada nas FA não se concretizará somente com planos, programas, boletins,
informativos, logotipos ou cartazes. É necessário interagir superiores e subordinados para a consecução dos objetivos estabelecidos, o que requer
a integração de conjuntos idiossincrásicos de comportamento.
A cultura
organizacional em ambiente militar deve, apoiada nas características peculiares
da organização militar, proporcionar aos seus componentes a capacidade de saber
discernir quanto e de que forma deverão flexibilizar o raciocínio e a conduta,
afastando-se temporariamente da rigidez necessária do cotidiano, para busca de
soluções às situações caóticas de crise, quaisquer que sejam. “Os subordinados
fazem quando ninguém precisa estar dizendo a eles o que devam fazer”.
A estrutura
hierárquica serve, principalmente, para manter a ordem e a perseguição do
objetivo comum, não é onde as ações ocorrem. As ações são conduzidas, por
pessoas, nos processos.
As pessoas
devem possuir papéis bem definidos nos processos, e se relacionarem
harmoniosamente entre si.
A crença de que
a guerra tem por motivação um valor maior compartilhado por todos os cidadãos
do País, um “bonum comununae” que existe no interesse de todo povo, não apenas
torna possível a cada soldado fazer sacrifícios como, também, agrega como
valor de compromisso com uma comunidade que nele acredita. Torna-se, portanto,
crucial a interação sociedade (povo) brasileira e Forças Armadas, a confiança
deve ser estimulada e qualquer tipo de vilipêndio rapidamente rechaçado.
O soldado
deve se sentir seguro, “em casa”, em sua Instituição.
O sentimento de vinculação, o saber confiar um no outro e a convicção de cada
um pode confiar em todos os outros do mesmo grupo levam o homem a todos os
sacrifícios pela ideia de camaradagem. O desempenho do indivíduo será visto
como o desempenho da Instituição, orgulhoso de a ela pertencer e
abandoná-la significa traição.
Ver a
organização como grupo é gerar
espaços para mais líderes com objetivos estimulantes; é acreditar que os
subordinados guiados pelo espírito de corpo usarão a liberdade para alcançar os
objetivos compartilhados.
Os
integrantes da Instituição devem se sentir, realmente, parte da Força, seguras
e protegidas, empolgadas com a visão de futuro, missão, objetivo e os valores,
e crendo plenamente que todos
estejam vivendo e trabalhando dentro das normas determinadas, contribuindo
e inspirando definições de uma
visão de futuro compartilhada, a fim de alinhar a energia de todos.
Grandes chefes
geram em suas organizações um senso de liberdade, voluntariedade e valor comum.
Comandantes fazem isso com grande facilidade nas organizações menores.
Chefes de todos
os níveis cuidam dos seus subordinados e os protegem. Ouvem e fazem o melhor
para aceitar as contribuições e as ideias divergentes dos subordinados com
tentativas sinceras de ajuda.
[1]
Carlos Alberto Pinto Silva / General de Exército da reserva / Ex-comandante do
Comando Militar do Oeste, do Comando Militar do Sul, do Comando de Operações
Terrestres, Ex-comandante do 2º BIS e da 17ª Bda Inf Sl, Chefe do EM do CMA,
Membro da Academia de Defesa e do CEBRES.
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